Um grupo ainda não identificado incendiou, nesta terça-feria, dia 15, uma aldeia do Povo Guarani Kaiowá, previamente desocupada, próxima ao Município de Rio Brilhante no Mato Grosso do Sul. Os indígenas defendem a permanência na região e atualmente lutam pra que a área seja demarcada como Terra Indígena Ñanderu Laranjeira. Para eles, o local é uma terra ancestral que pertencia a seus antepassados, motivo pelo qual construíram a aldeia. Foram incendiadas 36 casas indígenas nas quais viviam até sexta-feira passada 130 pessoas que saíram do local por ordem da Justiça.
Os agressores permaneceram a madrugada inteira na área para garantir que eram queimadas todas as casas, construídas em madeira e palha, e para amedrontar os indígenas, que estão acampados na beira de uma estrada vizinha. No incêndio, morreram vários cães e animais de criação que os índios ainda mantinham na aldeia.
A comunidade indígena está muito abalada com o ocorrido, principalmente porque, de acordo com suas tradições, acreditam que junto com as casas, foram queimados os espíritos de seus antepassados que viviam nelas. “Os índios estão tristes. O fazendeiro não podia ter feito o que fez. Na tradição Kaiowá, não queimamos as casas que deixamos para trás. Para nós, quando a gente deixa uma casa vazia, fica um espírito para cuidar dessa casa. O fazendeiro fez mal a 36 espíritos”, afirmou o cacique José Barbosa de Almeida, o Zezinho.
O cacique denunciou ainda que as casas foram queimadas por fazendeiros e por um grupo de pistoleiros. “Entraram uns 20 carros lá. As casas já tinham sido derrubadas com trator e logo vimos o fogo levantar”, afirmou o líder indígena. E acrescentou que os proprietários da fazenda desrespeitaram um acordo firmado pelo delegado da Polícia Federal que comandou a reintegração de posse da área. A desocupação aconteceu de forma pacífica e na sexta-feria passada os Guarani se mudaram para a margem da BR-163, a 10 km do perímetro urbano de Rio Brilhante.“O delegado Alcides nos garantiu que as casas não seriam destruídas, porque ele sabia que a gente ia usar o sapé para fazer uma casa de reza na beira da estrada”. Zezinho afirmou que vai denunciar o caso ao Ministério Público Federal em Dourados e espera uma ação imediata da Justiça.
Os proprietários de terras têm impedido, a qualquer custo, a realização dos estudos de identificação pela Fundação Nacional do Índio (Funai) através da intimidação e proibição de acesso dos antropólogos à área, que neste caso, se encontra dentro da fazenda Santo Antonio de Nova Esperança. Depois de uma longa batalha judicial, uma decisão recente da Justiça Federal finalmente determinou o início dos trabalhos de identificação em todo o estado, o que deve acontecer nos próximos meses. Mesmo assim, os fazendeiros têm dado declarações de que não pretendem colaborar.
Os latifundiários de todo estado se uniram, em peso, contra os indígenas através de associações de classe e, respaldados pelo poder econômico, são responsáveis por uma acirrada campanha na mídia local para promover a discriminação, sucessivas ações na Justiça contra os direitos indígenas e uma variedade de atos de violência e crimes que vão de ameaças a estupros e assassinatos. A maioria dessas atrocidades é cometida por funcionários e pessoas ligadas aos fazendeiros, que até o momento continuam impunes.
Pistoleiros
Os proprietários da fazenda Santo António de Nova Esperança e donos de áreas vizinhas contrataram uma empresa de segurança privada para vigiar as propriedades e evitar novas ocupações indígenas. O advogado Mário Júlio Cerveira, um dos proprietários da Santo Antônio, confirmou nesta terça-feira que a Gaspem Segurança, com sede em Dourados, está atuando no local.
A Gaspem tem histórico de confrontos em áreas ocupadas por indígenas. Em dezembro de 2005, seguranças da empresa foram acusados de matar a tiros o índio Dorvalino Rocha, 39, em Antonio João, na fronteira com o Paraguai. O segurança João Carlos Gimenes foi preso pela Polícia Federal e confessou o crime. O tiro que matou Dorvalino saiu de um revólver calibre 38 pertencente à Gaspem.
Na época, a Gaspem teria sido contratada por fazendeiros de Antonio João, entre eles Dácio Queiroz Silva, ex-prefeito do município e atual diretor da Famasul (Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul). Os indígenas reivindicam quase dez mil hectares em Antonio João, onde afirmam existir a área de Nhanderu Marangatu, que chegou a ser demarcada pela presidência da República, mas até hoje não foi ocupada em decorrência de recursos obtidos pelos fazendeiros na Justiça Federal.
No dia 8 de janeiro de 2007, seguranças que seriam ligados à Gaspem foram acusados de matar a índia Xurete Lopes, 70, durante desocupação forçada da fazenda Madama, no município de Amambai. Na época, o Ministério Público Federal disse que os suspeitos eram ligados à Gaspem.
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