APIB EXIGE A REVOGAÇÃO TOTAL DA PORTARIA 303 DA AGU
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, diante da decisão da Advocacia Geral da União (AGU) de publicar um
ato de vacância da lei (Vacatio Legis), adiando por 60 dias a entrada em vigor da
Portaria 303, que busca “normatizar” a atuação dos órgãos jurídicos da
Administração Pública Federal direta e indireta em relação às salvaguardas
institucionais às terras indígenas, reafirma o seu repúdio a este propósito de restringir
ou socavar os direitos dos povos indígenas garantidos pela Constituição Federal
e por instrumentos internacionais como a Convenção 169 da OIT, que é lei no
país desde 2004, e a Declaração da ONU sobre os direitos dos Povos Indígenas.
Num Estado de direito democrático esta Portaria, nem mesmo emendada,
não se sustenta, por suas marcas de autoritarismo, arbitrariedade, manipulação
e inconstitucionalidade, tudo para atender os interesses do capital, das
empreiteiras envolvidas com os grandes empreendimentos, da grande indústria,
das corporações, do latifúndio, do agronegócio, enfim, da base de sustentação
do Governo no Congresso Nacional e em outras estruturas do Estado.
Para a APIB, o Governo, por meio desta medida, agiu de má fé ao
pretender estender a todas as terras indígenas as condicionantes adotadas pelo
STF em função de uma causa específica, isto é, para o caso da Terra Indígena
Raposa Serra do Sol. O pior, este caso ainda não transitou em julgado. Ou seja, o
entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal na Petição 3.388 RR (Ação
Popular proposta contra o ato administrativo que demarcou a Terra Indígena
Raposa Serra do Sol), referência para a AGU dispor sobre as salvaguardas
institucionais às terras indígenas, ainda poderá ser alterado e esclarecido, em
razão do julgamento de Embargos de Declaração interpostos por assistentes do
Autor e por Comunidades Indígenas assistentes da União e da Funai. Esses
embargos foram incluídos na pauta de julgamento do STF, devidamente publicada
no Diário da Justiça em 19 de abril de 2012. A própria AGU, além da Procuradoria Geral
da República e da Procuradoria Geral Federal foi intimada pessoalmente sobre a
publicação, tendo seus respectivos mandados de intimação juntados ao processo
no dia 18 de julho de 2012.
Dessa forma, a AGU errou ao ultrapassar as suas atribuições,
definidas pela Lei Complementar nº 73, de 1993, e decidir interpretar uma
decisão judicial, para “normatizar” a atuação dos órgãos jurídicos da
Administração Pública Federal direta e indireta em relação às salvaguardas institucionais
às terras indígenas.
Com essa decisão apressada o Governo Federal, através da AGU,
atropelou vergonhosamente os direitos constitucionais dos povos indígenas, querendo
legalizar a usurpação de seus territórios. Pretendeu se sobrepor à Suprema
Corte e desvirtuou todas e quaisquer iniciativas de diálogo, negociação e
consulta construídos ou em andamento com os povos indígenas, seus dirigentes e
instituições representativas tais como a Comissão Nacional de Política
Indigenista (CNPI) e o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) que promove a
regulamentação dos mecanismos de aplicação do direito de consulta e
consentimento livre, prévio e informado, estabelecido pela Convenção 169 da
Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Para a APIB a continuidade desses espaços só faz sentido e ganha
legitimidade se o Governo da Presidente Dilma revogar integralmente esta
atrocidade jurídica, que representa a Portaria 303.
A APIB não admite apenas a “revisão” dos termos deste instrumento,
como defende o órgão indigenista oficial, a FUNAI, em nota técnica de 20 de
julho, muito menos a decisão de adiar por 60 dias, até o dia 24 de setembro, a
entrada em vigor do texto, para nesse período permitir “a oitiva dos povos indígenas sobre o tema”.
Os povos indígenas não podem aceitar artimanhas de nenhum tipo,
que no final das contas busquem apagar ou restringir os seus direitos garantidos
pela Constituição Federal, em favor do neodesenvolvimentismo, do progresso e do
crescimento econômico, defendidos pelo atual governo e suas bases de
sustentação. Mesmo que o ministro-chefe da Advocacia-Geral da União, justifique
a medida alegando, sobretudo, “razões de segurança”, visão impugnável
igualmente pois continua tratando os povos indígenas como ameaças ao
desenvolvimento do país e da segurança nacional.
Por todas essas razões e outras já manifestadas no repúdio de 18
de julho, a APIB chama os povos e organizações indígenas, comunidades e
lideranças, instituições aliadas e parceiras, nacionais e internacionais, a se
unirem e mobilizarem pela revogação total da Portaria 303 de 16 de julho da
Advocacia-Geral da União, e não aceitar
conversar com o governo sobre qualquer assunto que os afete até que aberração jurídica seja revogada.
Brasília, 26 de julho de 2012.
ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL - APIB