terça-feira, 13 de setembro de 2011

Povos Indígenas do Sul realizam mobilizações contra irregularidades em edital da Secretaria Especial de Saúde Indígena

Os Povos Indígenas da região sul iniciaram na manhã desta terça-feira, dia 13, uma série de mobilizações simultâneas, nos três estados, para protestar contra o que classificam como uma tentativa de fraude através do edital 01/2011, da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), que estabelece convênios com organizações para atenção à saúde indígena. Até que a SESAI realize concurso público para a contratação de equipes de saúde, composta por médicos, enfermeiros, dentistas, agentes de saúde e de saneamento, o atendimento à saúde indígena continuará a ser terceirizado, ficando a cargo de organizações não governamentais. É exatamente disto que trata o edital.

No início do mês, as lideranças, caciques e os Presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena do Litoral Sul e Interior Sul protocolaram documento na SESAI pedindo a impugnação do edital, sob a alegação de que houve direcionamento em favor de uma determinada organização ligada aos partidos políticos que comandam a FUNASA, antiga responsável pela saúde indígena. O interesse destes políticos seria continuar com o controle do atendimento aos índios através da organização favorecida. O pedido de impugnação enviado à Secretaria de Saúde Indígena não foi aceito e as lideranças então decidiram recorrer à 6a Câmara da Procuradoria Geral da República e ao Ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Até o momento não obtiveram resposta.

Ainda de acordo com as lideranças, das atuais 34 organizações credenciadas apenas uma, a UNIFESP, que também atua no parque do Xingu, permaneceu. Esta organização estaria sendo favorecida graças a ligações políticas.

Indignados com a demora na resolução do problema e com a postura irredutível em relação ao edital assumida pelo Dr. Antonio Alves, responsável pelo comando da SESAI, os indígenas resolveram fechar por algumas horas a BR-10, em Santa Catarina, e também ocupar os escritórios da Secretaria e dos Distrito Sanitários em Curitiba e Porto Alegre.

Entre as exigências apresentadas no documento encaminhado ao governo, além da anulação do edital, está também a exoneração imediata de Antonio Alves, e “a manutenção da força de trabalho e a ampliação dos recursos destinados à atenção à saúde dos povos indígenas e que seja doravante garantido o que foi disposto quando do planejamento da formulação da saúde indígena, que previa autonomia para que cada distrito elabore seu próprio chamamento e celebre o convênio”.

“Queremos garantir a transparência do processo e a qualidade da saúde dos indígenas que representamos. Não podemos deixar nossas aldeias à mercê de partidos”, afirma Hyral Moreira, do povo Guarani, Presidente do CONDISI-LISUL. Ainda de acordo com Moreira é um absurdo a proposta da SESAI de contratar apenas uma equipe para atender mais de três mil indígenas. Ele também confirmou que recebeu a informação de que a Dra. Ana Lucia Hartman, procuradora de Santa Catarina, pretende entrar nas próximas horas com uma liminar contra o edital.

As lideranças pretendem continuar com as mobilizações até que tenham uma resposta do Governo Federal para suas demandas. E ressaltam ainda que a partir de agora irão conversar diretamente com o Ministro da Saúde. O coordenador da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ARPINSUL), Romancil Cretã Kaingang, garante que todos os povos e aldeias da região fecharam posição em relação à questão e não desistirão da luta.

Leia abaixo a íntegra do documento divulgado pelas lideranças indígenas com as principais demandas em relação à saúde indígena:

Á
6ª Câmara da Procuradora geral da Republica
Ao Exmo. Senhor Ministro da Saúde Dr. Alexandre Padilha,
Às Procuradorias do Ministério Publico dos estados do Rio grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo Rio de Janeiro.

Nós Lideranças e representantes das Organizações indígenas dos 5 estados- RS, SC, PR, SP, e RJ- abaixo citadas, reunidas na aldeia M’Biguaçu no dia 9 de setembro de 2011.

Vimos expressar nossa insatisfação indignação com os rumos que vem tomando a Saúde Indígena a partir da criação da SESAI, que culminaram em um ato moral e eticamente condenável, que alija os indígenas de sua autonomia e direitos, além de afrontar a legislação da saúde indígena.

Para tanto, exigimos:

1. A anulação do edital de chamamento de entidades para a celebração de convenio para a atenção a saúde das populações indígenas, o qual foi planejado e executado sem a participação dos representantes indígenas, tendo sido viciado e direcionado para que fosse vencedora uma entidade, em detrimento de outras que já se mostram capazes de oferecer um serviço que atende aos princípios da Lei Arouca de 1999, (lei do subsistema), que é de oferecer uma atenção diferenciada que atenda às especificidades culturais e promova a equidade no acesso aos serviços. Procederam, no feriado edital, exigindo documentação que não é condição sinequanon para celebrar convênios e receber recursos da união para sua execução, portanto, não poderia servir para eliminar da concorrência 21 entidades, beneficiando uma só entidade, a única no Brasil todo a ter o certificado exigido.

2. A exoneração imediata do Secretario Antônio Alves, por trair a confiança dos povos e organizações indígena, agindo de forma oposta a sua própria palavra e ao que foi acertado em reuniões indígenas, agindo de forma oposta a sua própria palavra e ao que foi acertado em reuniões com participação das suas lideranças. É flagrante o desrespeito e dignidade dos povos indígenas, como o de participação nas decisões, expressos nos artigos 6º E 7º da convenção 69 da OIT, com o que não podemos compactuar nem aceitar de forma alguma.

3. A manutenção da força de trabalho e a ampliação dos recursos destinados à atenção à saúde dos povos indígenas para que possamos enfrentar os múltiplos desafios que persistem para que se alcance uma assistência à saúde de qualidade, com ênfase na prevenção e promoção da saúde. Só assim poderemos atingir níveis de saúde próximos aos que desfruta a população não indígena. Lembramos que a mortalidade infantil, embora em declínio, ainda encontra-se em níveis superiores ao da população não indígena. Consideramos, após termos atingido parcialmente objetivo como este, que a proposta de força de trabalho que agora está sendo representada é um retrocesso, que vai colocar em risco a saúde das nossas crianças, principalmente. Não podemos aceitar que se utilizem os mesmos parâmetros que regem a assistência das populações não indígenas, visto que as dificuldades de acesso já sabidas, as quais motivaram a Lei Arouca, de 1999.
4. Que seja doravante garantido o que foi disposto quando do planejamento da formulação da saúde indígena, que previa autonomia para que cada distrito elabore seu próprio chamamento e celebre o convenio.

Lembramos o ocorrido em 2009, quando a Associação Rondon Brasil continue prestando o serviço que vem sendo prestado de qualidade e compromisso reconhecidos entre as comunidades indígenas.

Para fazer valer nossos direitos, estamos dispostos a desencadear um movimento com manifestações, bloqueios e ocupações que se seguirão até que sejamos escutados e nossas necessidades atendidas.

Assinam

Comissão Ñemonguetá de lideranças do litoral de Santa Catarina
Arpin-Sul
Arpin-sudeste (São Paulo)
Conselho de saúde indígena regional de Guarapuava
Cepin
Cepisp

Nenhum comentário:

Postar um comentário