A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, em atenção à
apreensão e incertezas geradas nos povos e comunidades indígenas das distintas
regiões do país, vem de público exigir do governo da Presidente Dilma a
revogação integral da Portaria 303, de 17 de julho, não admitindo apenas a
suspensão temporária deste equivocado e inconstitucional ato
jurídico-administrativo que restringe de forma absurda os direitos originários
e fundamentais dos nossos povos e comunidades.
Sob pressão do movimento indígena e seus aliados, o governo
decidiu pela suspensão temporária da Portaria, primeiro por dois meses, depois
por prazo indeterminado, por meio da Portaria 415, de 17 de setembro, até o
Supremo Tribunal Federal (STF) julgar definitivamente o alcance das
condicionantes decididas para o caso específico da terra indígena Raposa Serra
do Sol (Petição 3388/RR). O movimento indígena, porém, sempre reivindicou a
revogação integral da medida.
A opção pela suspensão, demonstra o viés autoritário do governo,
que mesmo reconhecendo que a Suprema Corte terá ainda que se pronunciar de
forma definitiva sobre as condicionantes estabelece no Artigo 6º. da Portaria
415 que a 303 entrará em vigor no “dia seguinte ao da publicação do acórdão nos
embargos declaratórios a ser proferido na Pet 3388-RR que tramita no Supremo
Tribunal Federal”.
Para o governo parece irrelevante o resultado do julgamento do STF
ou então tem a pretensão de que a Suprema Corte corrobore apenas os seus
propósitos. Por isso nem cogita a
possibilidade de que as condicionantes sejam modificadas ou afastadas. Dessa
forma, o governo deixa clara a sua opção de favorecer o latifúndio, o
agronegócio, enfim, as forças econômicas e políticas interessadas nas terras
indígenas e suas riquezas.
Diante desse quadro, é importante lembrar dos efeitos nefastos do
ato em questão.
A Portaria 303 afirma que as terras indígenas podem ser ocupadas
por unidades, postos e demais intervenções militares, malhas viárias,
empreendimentos hidrelétricos e minerais de cunho estratégico, sem consulta aos
povos e comunidades; determina a revisão das demarcações em curso ou já
demarcadas que não estiverem de acordo com o que o STF decidiu para o caso da
Terra Indígena Raposa Serra do Sol; ataca a autonomia dos povos indígenas sobre
os seus territórios; limita e relativiza o direito dos povos indígenas sobre o
usufruto exclusivo das riquezas naturais existentes nas terras indígenas;
transfere para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBIO) o controle de terras indígenas sobre as quais indevida e ilegalmente
foram sobrepostas Unidades de Conservação; e cria problemas para a revisão de
limites de terras indígenas demarcadas que não observaram integralmente o
direito indígena sobre a ocupação tradicional.
Não entanto, setores do governo tem trabalhado no sentido de convencer
lideranças e comunidades a não se mobilizarem mais, uma vez que a Portaria está
suspensa, como se a decisão fosse equivalente à revogação. O governo insiste
inclusive em querer prosseguir com a implementação do processo de
regulamentação dos mecanismos de consulta estabelecidos pela Convenção 169 da
Organização Internacional do Trabalho (OIT), mesmo sabendo da incoerência
exposta na Portaria 303 que despreza os direitos dos povos indígenas assegurados
por esta Convenção e a Constituição Federal.
Considerando todos esses fatos, a APIB repudia a decisão da AGU de
advogar contra os nossos povos, desrespeitando os seus direitos originários e fundamentais,
e exige a revogação integral da Portaria 303, para que seus efeitos não
continuem aumentando o clima de tensão e conflito que cerca as terras
indígenas, e a insegurança jurídica, social e política que aprofunda os
sofrimentos dos nossos povos e comunidades.
Brasília, 02 de outubro de 2012.
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